ENQUANTO E NAO

quarta-feira, outubro 31, 2007

A DÍVIDA, de que somos escravos



Este é um livro que ninguém deve deixar de ler. Aconselho-o vivamente a todas as pessoas que estejam interessadas em conhecer, com verdade,o que se passa à sua volta e queiram compreender as armadilhas em que involuntariamente somos envolvidos.Todos. Uma minoria como cumplices e o resto como vítimas.



o Império da vergonha

Jean Ziegler é o último dos nossos profetas. Desde há uns trinta anos que ele se revolta, sem cessar. [...] O seu último livro trata de um único assunto:
a injustiça, que a nova ordem mundial nunca favoreceu tanto.

Ziegler acusa os «cosmocratas», estes novos senhores feudais do planeta globalizado, em cuja primeira fila figuram os dirigentes das grandes empresas transcontinentais. Segundo ele nos recorda, essas empresas detêm, só por si, 555 mil milhões de dólares de reservas e os seus meios ultrapassam as suas próprias capacidades de investimento.

É assim que elas distribuem, aos seus accionistas, «dividendos fabulosos e, aos seus gestores, gratificações astronómicas»
- escreve Jean Ziegler.”

Jean-Cristophe Rufin (Le Nouvel Observateur, 6/4/05)-


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Para poderem fzer uma ideia, aqui deixo uma passagem de um dos capítulos da obra em questão. Mas o melhor, depois de a ler é adquirir o livro. É obrigatório

A DÍVIDA

Os povos dos países pobres matam-se com trabalho para financiarem o desenvolvimento dos países ricos. O Sul financia o Norte, e especialmente as classes dominantes dos países do Norte. O mais poderoso dos meios de dominação do Norte sobre o Sul é hoje o serviço da dívida.

Os fluxos de capitais Sul-Norte são excedentários em comparação com os fluxos Norte-Sul. Os países pobres entregam anualmente às classes dirigentes dos países ricos muito mais dinheiro do que aquele que recebem delas, na forma de investimentos, de créditos de cooperação, de ajuda humanitária ou de ajuda dita ao desenvolvimento.

Em 2003, a ajuda pública ao desenvolvimento fornecida pelos países industriais do Norte aos 122 países do Terceiro Mundo elevou-se a 54 mil milhões de dólares. Durante o mesmo ano, estes últimos transferiram para os cosmocratas dos bancos do Norte 436 mil milhões de dólares à conta do serviço da dívida. Esta última é a expressão pura da violência estrutural que define a actual ordem do mundo.

Hoje nem são precisas metralhadoras, napalm, blindados, para escravizar e submeter os povos. A dívida trata do assunto.,

O «Jubileu 2000» é uma vasta associação de cristãos oriundos dos países europeus mais diversos. A propósito da entrada no novo milénio, essas mulheres e esses homens lançaram uma campanha pública de rara eficácia com o objectivo de mostrarem à consciência ocidental os crimes cometidos em nome da divida» (a)

Para essa associação, a pressão exercida pelos credores (do I FMI, dos banqueiros privados) sobre as mulheres famélicas, os homens e as crianças de África, da Ásia do Sul, das Caraíbas e da América Latina equivale a uma negação de soberania.

A época da dominação pela dívida seguiu-se, sem transição, à época colonial. A violência subtil da dívida substituiu a brutalidade visível do poder metropolitano. Um exemplo. No começo dos anos 1980, o FMI impôs um plano de ajustamento estrutural particularmente severo ao Brasil. O Governo teve de reduzir maciçamente as suas despesas. Entre outras coisas interrompeu uma campanha nacional de vacinação contra o sarampo. Uma epidemia aterradora de sarampo grassou então no Brasil, mais precisamente em 1984. Morreram dezenas milhares de crianças não vacinadas. ,, A dívida matou-as.

O «Jubileu 2000» calculou que, em 2004, todos os cinco segundos, morre uma criança menor de 10 anos por causa da dívida. (a)

A dívida beneficia duas categorias de pessoas: os cosmocratas (os credores estrangeiros) e os membros das classes dominantes autóctones. Olhemos primeiro para o lado dos credores.»

Eles impõem condições draconianas aos países devedores. Na verdade, os governos do Terceiro Mundo têm de pagar» pelos seus empréstimos, taxas de juro cinco a sete vezes mais elevadas do que as praticadas nos mercados financeiros. Os cosmocratas ditam ainda outras condições: privatizações e venda ao estrangeiro (justamente aos credores) das raras empresas, minas, serviços públicos (telecomunicações, etc.) rendíveis, privilégios fiscais exorbitantes para as sociedades transcontinentais, compras de armas forçadas para equipar as! forças armadas autóctones, etc.

Mas a dívida também beneficia maciçamente as classes dominantes dos países devedores. De facto, muitos governos do I hemisfério sul são meros representantes dos interesses de uma pequena fracção do seu povo, as classes ditas «compradoras». Que designa esta palavra? Dois tipos de formações sociais.

Primeiro tipo: no tempo da colonização, o patrão estrangeiro teve necessidade de auxiliares autóctones. Concedeu-lhes privilégios, atribuiu-lhes certas funções, deu-lhes uma consciência (alienada) de classe. Nas maioria dos casos, esta sobreviveu à partida do colonizador e tornou-se a nova classe dirigente do estado pós-colonial.

Segundo tipo: na sua maior parte, os estados do hemisfério sul são hoje economicamente dominados pelo capital financeiro estrangeiro e pelas companhias transcontinentais privadas. As potências estrangeiras empregam directores e quadros locais que financiam advogados locais, jornalistas, etc., e que têm a seu soldo (embora discretamente) os principais generais e os chefes da polícia. Formam um segundo conjunto comprador.

A burguesia compradora é a burguesia «comprada» pelos novos feudais. Ela defende os interesses deste últimos e não os interesses do povo de ponde saiu.

Hosni Mubarak, presidente do Egipto, chefia um regime prevaricador e corrupto. Tanto a sua política interna como a sua política regional são inteiramente ditadas pelos decretos e interesses dos seus tutores norte-americanos. Pervez Mucharraf reina sobre o Paquistão. Os serviços secretos americanos protegem-no e sustentam-no. É directamente de Washington que ele recebe quotidianamente as suas ordens.

E que dizer das classes latifundiárias das Honduras e da Guatemala, das classes dirigentes da Indonésia e do Bangladesh? Os seus interesses estão intimamente ligados aos interesses das companhias transnacionais activas nos seus países. Eles riem-se dos interesses elementares, das necessidades vitais dos seus povos.

No Sudão, os diferentes consórcios petrolíferos sustentam financeiramente diferentes fracções da classe dirigente compradora. Na verdade, Osmar Bongo, no Gabão, e Sassou N'Guess0, em Brazzaville, não ficariarn muito tempo no poder sem o dinheiro, a assessoria ,a protecção que lhes dá a ELF, sociedade transcontinental de petróleo de origem francesa.

A alienação cultural das elites de certos países do Terceiro Mundo não pára de surpreender pela sua profundidade.

(a)Sobre o nascimento e a estratégia de «Jubileu 2000», ver Conferência dos Bispos do Brasil (CBB), A Vida acima da Dívida, Rio de Janeiro, CBB, 2000.

Nota: Os sublinhados são da minha responsabilidade

quinta-feira, outubro 25, 2007

PORREIRO, PÁ, disseram eles...

PORREIRO, PÁ,
Foi o que o ex-PPD Sócrates disse ao ex-MRPP Barroso no final da conferência que aprovou o texto do chamado Acordo de Lisboa e que mais não é que o chumbado (e agora travestido) projecto de Constituição Europeia.

Porreiro? Porreiro, para quem?
Não para o povo português, não para os povos que a tal tratado vão ficar sujeitos.
Porreiro, só se for para os eurocratas e para o sistema global da dolarcracia, baseado unicamente nos interesses do FMI e da alta finança em geral.

A este propósito, transcrevo do Diário de Notícias de ontem mais uma óptima e esclarecida crónica de Baptista Bastos.
Os sublinhados são de minha responsabilidade



A CRISE DA ESQUERDA


Baptista-Bastos
escritor e jornalista
b.bastos@netcabo.pt

Discreteando sobre La Chinoise, o grande clássico de Godard, para unir a tese de "filme político" ao ensaio de Bernard-Henry Levy, Ce Grand Cadavre à la Renverse, João Lopes escreveu, anteontem, no Diário de Notícias, um belo artigo, que propõe amplas vias de reflexão. O "património de imagens", referido pelo articulista, a fim de definir o que embala, hoje, a esquerda, coloca o problema na confusão que se apoderou da política. João Lopes nunca se afastou do princípio [de Aristóteles a Adorno] segundo o qual a estética está associada a uma ética, e ambas são o traço identificador de uma cultura relacionada com a ideologia.

As "imagens" são, pois, o património da memória, que a direita tem procurado, amiúde com êxito, apagar ou desvirtuar. Estabelecendo paralelos entre diferentes manifestações de arte, Lopes intitula o texto "Repensando a Crise da Esquerda Europeia", a fim desembocar nas múltiplas incertezas de que La Chinoise fazia questão central e premonitória, ante-Maio de 68. Porém, a crise da esquerda decorre da crise da direita, porque ambas são complementares. E poucas vozes, na Europa, de um e de outro lado, conseguiram abandonar as concepções ultrapassadas do mundo, de que são dramaticamente prisioneiras. Veja-se a ambiguidade do Tratado de Lisboa, e a astenia política dos seus antagonistas. O capitalismo sai largamente beneficiado, e a Europa dos "valores", da solidariedade nas diversidades culturais, da justiça e da democracia é severamente sovada. Esta civilização universal do acordo e do consenso não passa de ficção. Apenas o Pacheco Pereira tocou nos pontos sensíveis do pacto, advertindo estar em risco o modelo europeu de sociedade, porque nada, no Tratado, corresponde a uma garantia para o futuro. Podemos estar ou não de acordo com o Pacheco. Por vezes, irrita-me a soberba dos seus tiques de guru e o ar enfastiado com que ancora o discurso. Mas é um homem lido e bem informado, com o qual se pode ter conversa agradável, por vária e fundamentada. Há anos, escreveu uma série de artigos, no Público, sobre esquerda e direita, do melhor que a inteligência portuguesa produziu. Não resultou no debate necessário. Uma tertúlia de que faço parte, Os Empatados da Vida, distinguiu-o, então, com um almoço e o prémio do mês.

O "realismo" político da esquerda tem sido o do cumprimento das regras, sem contrariar o domínio do capitalismo global, cada vez mais selvático. A esquerda tem, somente, tentado salvar a mobília com que ataviou a sua história, aceitando, como mal menor, as imposições do "mercado". As "imagens" (cinematográficas ou literárias) de que fala lucidamente João Lopes, previnem-nos sobre o mais avassalador empreendimento anti-social de que há conhecimento - e aconselham-nos a agir. Como? A esquerda não ensina porque não sabe.

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Apenas uma reserva tenho a fazer ao artigo de Baptista-Bastos.
É que há a esquerda que assim se apelida e a esquerda que age realmente como esquerda.

Baptista-Bastos far-me-á o favor de concordar que uma boa parte do Sindicalismo europeu e em Portugal a CGT-P , resistem intrepidamente às investidas do sistema que tudo faz para os domesticar - com apoio cúmplice, diga-se, de boa parte dos “media”, que no caso da CGTP, tudo fazem para a denegrir, para a isolar, acusando-a de não ser mais maleável, de não se adaptar às circunstâncias actuais, patati, patatá..., isto é de resistir às imposições que o "sistema" e toda a sua corte de serventuários, gostariam de lhe impor.

Pois ainda bem que assim é. E os trabalhadores agradecem.
Força, CGTP!