JOSÉ AFONSO
José Afonso, o Zeca, como era carinhosamente tratado, nunca se acomodou, nunca procurou caminhos fáceis. Nem na sua vida privada, nem no seu percurso politico, nem na produção da sua música e das sua letras. Ele soube conciliar a música popular portuguesa e os temas tradicionais com as palavras de luta e de combate a tudo o que lhe parecesse injusto.
Antes do 25 de Abril, sendo professor, o ensino secundário foi impedido de leccionar pelo governo salazarista, apenas por causa do seu conhecido desafecto ao regime. O Zeca, porém arranjou maneira de continuar a “ensinar” da forma que mais gostava: através do canto e da palavra poética. De viola em punho, correu durante anos o país de lés de lés, cantando em colectividades de recreio ou culturais, ou académica não para fazer espectáculos – palavra que ele detestava – mas para fazer sessões de esclarecimento, sempre com a PIDE atrás dele, proibindo tais sessões quando delas tinha conhecimento, ou intervindo por vezes meio. Claro que não esteve só Outro cantores de intevenção se juntara a ele, mas ele era o mais talentoso, o mais integro – aquele que cujas baladas mais calavam no cortação de todos os que escutavam a sua voz meio rouca mas com uma força e uma beleza incomparáveis.
Depois do 25 de Abril, já em liberdade, continuou a compor canções de luta – ele sabia que a liberdade conquistada com o 25 de Abril era apenas o começo de toda uma luta que era preciso continuar e a participar, agora de uma forma mais intensa, quase febril em todos os eventos culturais aonde fosse necessário levar a palavra de revolução.
Tinha 57 anos quando faleceu em 23 de Fevereiro de 1987
A beleza e a força das suas canções, porém, jamais morrerão.
Em sua homenagem aqui deixo OS VAMPIROS - uma das sua canções mais emblemáticas. Está longe de ser melhores ou das mais bonitas, mas recordo-a por pensar que que 33 anos após o 25 de Abril, em termos de vampiragem, a situação hoje não é muito diferente. Estou mesmo convencido que se o Zeca fosse vivo e andasse por aí a cantar esta canção, ele Seria perseguido (pelo menos ostracizado), como foi no tempo do fascismo
OS VAMPIROS
No céu cinzento
Sob o astro mudo
Batendo as asas
Pela noite calada
Vem em bandos
Com pés veludo
Chupar o sangue
Fresco da manada
Se alguém se engana
Com seu ar sisudo
E lhes franqueia
As portas à chegada
Eles comem tudo
Eles comem tudo
Eles comem tudo
E não deixam nada
A toda a parte
Chegam os vampiros
Poisam nos prédios
Poisam nas calçadas
Trazem no ventre
Despojos antigos
Mas nada os prende
Às vidas acabadas
São os mordomos
Do universo todo
Senhores à força
Mandadores sem lei
Enchem as tulhas
Bebem vinho novo
Dançam a ronda
No pinhal do rei
Eles comem tudo
Eles comem tudo
Eles comem tudo
E não deixam nada
No chão do medo
Tombam os vencidos
Ouvem-se os gritos
Na noite abafada
Jazem nos fossos
Vítimas dum credo
E não se esgota
O sangue da manada
Se alguém se engana
Com seu ar sisudo
E lhes franqueia
As portas à chegada
Eles comem tudo
Eles comem tudo
Eles comem tudo
E não deixam nada
Eles comem tudo
Eles comem tudo
Eles comem tudo
E não deixam nada
3 Comments:
Felizmente vejo que por todo o lado, pelo menos em Lisboa, estão a relembrar com as homenagens mais do que vividas, a passagem por este Mundo do Zeca. Pelo meu lado já fui a 2 bem vivas de lembranças, com gente que conviveu com ele, e que tão bem sabe cantar as suas canções.
Mas nunca é demais recordá-lo por todo o lado, e aqui na blogosfera tenho encontrado várias referências a esta efemeride.
Já tenho nova história no meu blog, se quiser é só entrar, nem precisa bater á porta que será sempre bem vindo.
Um abraço
Teresa David
By Teresa David, at 26 fevereiro, 2007 00:32
Caro Amigo,
Apesar de tardia, acompanho a tua prestação de homenagem ao Grande Homem;
ao Grande Poeta; ao Grande Cantor que decerto irá fazer figura de destaque no nosso cancioneiro; O nosso eterno ZECA AFONSO.
"Eles comem tudo
e não deixam nada"
foi letra de uma canção que deixou os horrendos pides à "nora", conforme te deves lembrar.
Tenho muitas saudades desse tempo em que nascia nas nossas mentes o despertar de um lampejo para a liberdade.
Um apertado abraço
do Pepe.
By Pepe Luigi, at 27 fevereiro, 2007 17:20
Zeca é intemporal, por isso Zeca Afonso SEMPRE, pelo homem, pelo cantor, pelo baladeiro, pelo poeta, pelo compositor, pelo político, pelo cidadão, símbolo de uma geração e do Portugal da utopia. Para relembrar que hoje é dia de homenagem a Aquilino Ribeiro nos meus blogues. Boa semana.
By Anónimo, at 04 março, 2007 04:22
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