ENQUANTO E NAO

quarta-feira, janeiro 17, 2007

SOBRE A DESPENALIZAÇÃO DO ABORTO

A Campanha para o referendo sobre o aborto, embora oficialmente só comece a 30 de Janeiro, já está na rua. Este referendo, tal como o de 1998, eram bem escusados. A Assembleia da República já em tempos tinha apreciado uma proposta do PCP sobre a despenalização da interrupção voluntária da gravidez, tendo-se mostrado maioritariamente favorável à aceitação dessa proposta. Só por falta de coragem do então primeiro ministro Guterres e pelo seu conservadorismo beato não foi aprovada Lei que poria fim ao sofrimento e humilhação que tantas mulheres continuaram a ser vitimas da sua pusilanimidade. Acolitado pelo partido que então dirigia, o PS, preferiu referendar o assunto, dando azo a que a direita mais conservadora se moblizasse e o Não conseguisse uma vitória. Pouco significativa, é certo, mas suficiente para prolongar o indecoroso espectáculo de ver mulheres arrastadas até à barra dos tribunais –humilhação que todos condenam mas que, hipocritamente, se recusam a pôr-lhe fim

De novo - e contra a opinião do PCP que entendia que, tratando-se de um problema de legislação penal, a Assembleia da República tinha poderes para fazer aprovar um Lei que a maioria parlamentar entendesse justa - o PS de Sócrates, tal como o seu antecessor, teimou em enveredar pela via do referendo.

A campanha aí está. Os defensores do Não, de uma forma, mais aguerrida e mais organizada ainda do que no primeiro referendo e com argumento de uma violência e má fé inauditas, preparam-se para dar tudo por tudo para que o seu feroz ultramontanismo triunfe. Pelo lado do Sim, assiste-se a uma partidarização do assunto, limitando-se a uma defesa fria, sem garra, pouco convincente, parecendo que o que está em causa é mais o prestígio e os ganhos políticos de cada Partido do que a defesa do direito das mulheres.

Como compreender de outro modo a oposição de um dirigente do Bloco de Esquerda à inclusão num grupo de activistas pelo SIM por parte do actual Presidente da Câmara do Porto, só porque discorda da sua gestão como autarca, apesar de desde sempre ele se ter demonstrado um acérrimo defensor do Sim? Como compreender de outro modo o desabafo de Jerónimo de Sousa de que uma vitória do Não seria uma derrota para o PCP?

Não meus amigos. Uma vitória do Não será, pura e simplesmente uma derrota civilizacional. Não de qualquer Partido.Será uma vitória das trevas contra a luz, por muito que os ultraconservadores proclamem o contrário. Ora uma partidarização excessiva só pode prejudicar a causa que se pretende defender e levar, inclusivamente, ao desintersse e consequente abstenção.

O que é preciso explicar às pessoas é que NINGUÉM DEFENDE A PRÁTICA DO ABORTO. Os partidários do SIM são-lhe tão hostis como os partidários do NÃO. O que se pretende unicamente é que nenhuma mulher seja criminalizada quando tiver necessidade de a ele recorrer. Porque abortos, meus amigos fazem-se todos os dias. E quem os faz com mais frequência, porque de uma forma geral mais dinheiro têm, são os que hipocritamente contra ele mais vociferam e, por vezes, do alto dos púlpitos das igrejas, dizem as maiores barbaridades que, essas sim, deveriam envergonhar qualquer pessoa de bem. Faço ideia os abortos que se farão por detrás dos muros dos conventos!

Cidadãos do meu país, vamos dizer SIM ao direito que todas as mulheres têm de interromper até às dez semanas um gravidez indesejada ou até perniciosa, sem que, por isso ,tenham de ser, humilhadas presas e condenadas.

"Concorda com a despenalização da interrupção voluntária da gravidez, se realizada, por opção da mulher, nas primeiras dez semanas, em estabelecimento de saúde legalmente autorizado?"

Esta é a pergunta a que temos de responder nas urnas, no dia do referendo. Ninguém nos pergunta se concordamos ou não com aborto.

É assim tão difícil de perceber? Qual a pessoa bem formada que pode dizer não a esta pergunta? a menos que só queira ver esse direito reconhecido a quem tiver dinheiro para o fazer no estrangeiro.
É isso que queremos?

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Leia um novo "post"
"EM BUSCA DE MIM"
no meu outro blogue

http://escritosoutonais.blogspot.com

2 Comments:

  • Este texto sintetiza, de forma inteligente, o essencial sobre uma questão que há muito deveria ter deixado de ser um problema na nossa sociedade. O mais grave é que os partidários do "não" têm disso consciência também, porque são seres pensantes e racionais como os partidários do "sim". A diferença está na sua hipocrisia,e preferem defender uma postura deturpada e hipócrita, escudando-se atrás de falsos valores morais, em vez de contribuirem para a alteraçaõ de uma lei injusta. Afinal, eles precisam de alterar a lei para quê? Se precisarem, podem sempre recorrer às clínicas do estrangeiro...

    By Blogger Lovely Toys, at 18 janeiro, 2007 21:10  

  • Caro António: subscrevo integralmente o teu texto, e ainda mais na parte que concerne à Assembleia da República, que tinha e tem legalidade e maioria para aprovar a legislação em questão, para além do absurdo do País ir gastar desnecessariamente uma avultada quantia e energias na campanha.

    Penso que a campanha é folclore deste governo para desviar as atenções do real estado da Nação e dar um osso à esquerda, dizendo que está a “resolver” a questão.

    Um abraço e óptimo fim-de-semana.

    By Anonymous Anónimo, at 19 janeiro, 2007 18:20  

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