ENQUANTO E NAO

quinta-feira, junho 22, 2006

TIMOR: Alkatiri resiste

Mari Alkatiri recusa pedir a demissão. Quanto a mim faz muito bem. Xanana Gusmão assumiu aceita fazer o papel de pau-mandado dos australianos e de sua mulher., haja alguém que tenha dignidade naquele pobre país. Já agora, que seja Xanana, ele próprio, a levar até ao fim o triste papel em que se deixou envolver, até porque, na opinião de Ana Pessoa, jurista timorense e membro do governo “o primeiro-ministro Mari Alkatiri tem de sobreviver para que Timor-Leste possa sobreviver. Caso contrário, assistiremos a uma sucessão de governos sempre que umas quantas pessoas se reunirem para protestar.”

De tudo o que tive ocasião de ler na imprensa portuguesa julgo não andar longe da verdade se disser que fui das primeiras pessoas a denunciar, neste blogue, o carácter golpista e premeditado da crise que se abateu sobre Timor-Leste e o papel dúbio de Xana e Ramos-Horta nos tristes acontecimentos que ali se têm verificado.
Os ataques à casa de Mari Alkatiri e de Matan Ruak logo nos primeiros dias (aqui se vê quem é que queria matar quem), a protecção dada aos militares golpistas pelos soldados australianos, o inacreditável incêndio e destruição total dos arquivos sobre os crimes cometidos pelas milícias a soldo da indonésia, perante a passividade dos mesmos australianos, nunca me deixaram dúvidas sobre as intenções de quem premeditou toda esta trama.
Agora parece que ninguém já duvida, como se vê em diversos notícias e artigos que começam a surgir na nossa imprensa, dos quais destaco o editorial de hoje do Diário de Notícias assinado por Eduardo Dâmaso e intitulado “A Carta”
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"A situação política em Timor não pára de surpreender. O novo episódio da crise é epistolar - uma carta de Xanana a Alkatiri a exigir-lhe a demissão com base num programa da televisão australiana em que é afirmado que o primeiro-ministro teria promovido a distribuição de armas a militares da Fretilin.

O assunto da entrega das armas é melindroso e está a ser investigado pelas autoridades judiciais timorenses. Não há ainda nenhuma espécie de conclusão, mas o Presidente da República, que tem a especial obrigação de manter a serenidade e ser o garante das instituições, pôs o país em alvoroço dizendo em papel timbrado e com a solenidade das declara- ções de Estado o que a sua mulher diz habitualmente na cozinha lá de casa ou em incursões pelos bairros pobres de Díli.

Xanana escreve a carta num tom idêntico ao das declarações recentes da sua mulher, a australiana Kirsty Sword, sobre Alkatiri, em que esta não só disse que o primeiro-ministro devia demitir-se como anunciava que, caso não o fizesse, seria demitido pelo seu marido.

As relações de Estado em Timor já tinham descido ao mais baixo nível de paroquialidade quando se percebeu que em muito dependiam da vida do- méstica do Presidente. Agora passaram para a fase mais preocupante: o tom simplório com que têm sido comentadas as relações institucionais saiu mesmo da cozinha do Presidente e entrou nas instituições.

A carta de Xanana - que o DN publica nesta edição - representa a triste paródia a que chegou a política timorense. Um país que está à beira de uma guerra civil é atravessado por ódios mortais ao nível das mais altas figuras do Estado, fomentados por guerras antigas ou por interesses económicos e diplomáticos da Austrália.

Com este comportamento Xanana Gusmão volta a incendiar o clima político em termos que podem ser incontroláveis num país onde há centenas de civis armados, polícias e militares amotinados, rivalidades étnicas, invejas pessoais e que se transformou num palco de obscuras manobras diplomáticas. Com uma liderança que gere ódios o povo só pode mesmo é procurar abrigo do seu próprio medo. O braço-de-ferro entre Xanana e Alkatiri chegou a um ponto de não retorno e pode mesmo acabar num banho de sangue. E, até aqui, quem se tem esforçado por evitar tal tragédia tem sido Alkatiri e não o Presidente de Timor- -Leste.
Os sublinhados são da minha responsabilidade

Veremos qual o desfecho deste imbróglio, mas. Como já cá ando há muito tempo cada vez mais me faz lembrar os dramáticos acontecimentos de 1960 que envolveram a conspiração para levar à demissão e consequente assassinato do primeiro-ministro do Congo. Patrice Lumumba , mergulhando aquele país numa crise que dura até hoje, conforme aqui recordei na minha entrada de 28-5-2006.

Oxalá eu esteja enganado!
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"ERRO DE CASTING"
no meu outro blogue